Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é o primeiro nome da história da República brasileira, prestes a completar 133 anos, a ser eleito três vezes para a Presidência por meio do voto popular. O pernambucano venceu a disputa pelo Palácio do Planalto em 2002, em 2006 e agora em 2022.
Getúlio Vargas ocupou o cargo mais importante do país por quase 20 anos: de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954. Nenhum outro político governou por tanto tempo quanto o líder gaúcho, marca que dificilmente será superada. Mas Getúlio só foi escolhido pelo voto direto popular uma vez, em outubro de 1950. Nas demais ocasiões, ascendeu ao poder por meio de golpes (1930 e 1937) ou pelas mãos do Congresso (1934).
No período conhecido como Nova República, após a ditadura militar, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) foi eleito duas vezes, em 1994 e em 1998, assim como Dilma Rousseff (PT), em 2010 e em 2014.
Fernando Collor (àquela altura no PRN, hoje no PTB) conquistou a Presidência em 1989, mas não chegou a disputar a reeleição porque renunciou em meio a um processo de impeachment em 1992. Jair Bolsonaro (PL) venceu em 2018 e tentou a reeleição neste ano, mas, como se sabe, foi derrotado por Lula.
“Não há dúvida de que, nestas circunstâncias, só Lula seria capaz de vencer Bolsonaro”, diz João Roberto Martins Filho, professor titular do departamento de ciências sociais da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos). “Essa frente democrática, que vai além do PT, funcionou. E precisará continuar funcionando.”
Para Rodrigo Patto Sá Motta, professor titular de história do Brasil da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), o resultado deste segundo turno “é um marco fundamental da manutenção das instituições democráticas e republicanas, que têm a Constituição de 1988 como um momento importante”.
São três as vitórias de Lula para a Presidência, mesmo número de derrotas, curiosamente. Na sua primeira corrida ao Planalto, em 1989, o petista perdeu para Collor. Em 1994, foi derrotado por FHC, que havia sido ministro da Fazenda de Itamar Franco, cargo no qual lançou o bem-sucedido Plano Real. Em 1998, o tucano, que apoiou o petista neste segundo turno de 2022, voltou a superá-lo.
Outra curiosidade: com 77 anos recém-completados, Lula é a pessoa mais velha a se tornar presidente. A marca pertencia a Michel Temer (MDB), que assumiu o poder com 75 anos, em 2016.
Mais de 70 anos atrás, porém, seria chamado de doido ou coisa pior quem dissesse que o menino cujo registro de nascimento foi feito em 27 de outubro de 1945 chegaria ao posto máximo da República.
Penúltimo dos oito filhos de Eurídice Ferreira de Melo, a dona Lindu, e Aristides Inácio da Silva, ele vivia numa casa de chão batido, de um quarto, em um sítio em Caetés, um distrito de Garanhuns àquela altura.
No final de 1952, Lindu e os filhos pegaram um pau de arara rumo a Santos para reencontrar Aristides, que tinha uma segunda família na cidade do litoral paulista. Passado pouco tempo, a mãe e as crianças se afastaram de Aristides, homem violento com quem Lula nunca teve boa relação.
Na adolescência, em São Paulo, fez o curso profissionalizante de torneiro mecânico e começou a trabalhar como metalúrgico. Sofreu um acidente nessa época, no turno da madrugada na fábrica Independência.
Lula foi eleito deputado federal em 1986 e participou da Constituinte que aprovou a nova Carta em 1988. Na única incursão como parlamentar, teve participação acanhada, como contou Luiz Maklouf Carvalho no livro “1988 – Segredos da Constituinte”. O fato é que nunca se entusiasmou pela atuação no Legislativo.
Operário no poder Depois das três derrotas na disputa pelo Planalto, Lula conseguiu superar José Serra (PSDB) no segundo turno em 2002. A faixa que recebeu das mãos de FHC simbolizava novidades históricas: pela primeira vez no Brasil, um operário e um líder de um partido de esquerda assumia o governo federal.
O petista unificou os programas sociais e lançou o Bolsa Família, além de implantar projetos como ProUni (Programa Universidade para Todos) e Luz para Todos. A política econômica manteve, em linhas gerais, as diretrizes da gestão anterior. Ainda na seara financeira, o governo quitou a dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI). As taxas de desmatamento começaram a cair de forma expressiva.
Em junho de 2005, veio à tona o mensalão, esquema no qual os congressistas recebiam dinheiro em troca de apoio à administração federal. O escândalo derrubou o principal ministro do governo, José Dirceu, dizimou a cúpula do partido e desgastou o presidente –foi o pior momento dos anos Lula.
O mensalão não impediu, porém, que Lula se reelegesse, derrotando Geraldo Alckmin (então no PSDB) no segundo turno em outubro de 2006. Dezesseis anos depois, transcorrido um sem fim de reviravoltas políticas, Alckmin, agora no PSB, uniu-se a Lula como vice na chapa petista.
Sob o efeito do mensalão, ampliou sua base no Congresso para o novo mandato, incorporando o PMDB (hoje MDB). A partir de 2007, o governo reforçou os programas sociais e lançou o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que ajudou a dar visibilidade à então ministra Dilma Rousseff.
Houve uma queda de mais de 40% do total de brasileiros vivendo abaixo da linha de pobreza entre 2003 e 2010, período em que foram criados cerca de 14 milhões de empregos. Por outro lado, desequilíbrios da política econômica nos anos finais da era Lula contribuíram para a recessão vivida pelo país anos depois.
Ao fim do segundo mandato, o petista tinha 83% de aprovação, segundo o Datafolha.
Declínio e nova ascensão Depois da passagem de poder, quando Dilma se tornou a primeira mulher a presidir o país, os reveses para Lula, em vários aspectos, começaram a se acumular. Despontavam discordâncias entre ele e a sucessora e, ao mesmo tempo, Lula enfrentou um câncer de laringe ao longo dos anos de 2011 e 2012.
Em 2016, já após a reeleição de Dilma, os problemas se acentuaram. Virou alvo da Lava Jato por suspeitas envolvendo um tríplex em Guarujá: foi denunciado pelo Ministério Público sob a acusação de receber R$ 3,7 milhões de propina da empreiteira OAS em decorrência de contratos da empresa com a Petrobras. O valor, apontou a acusação, referia-se à cessão pela OAS do tríplex a Lula e a reformas feitas pela construtora no imóvel.
A defesa dele negava as irregularidades e afirmava que ele nunca havia sido dono do apartamento.
Naquele mesmo ano, Lula acompanhou a queda de Dilma. Sem força no Congresso, a presidente teve que deixar o poder após um processo de impeachment, considerado um golpe pelas forças de esquerda.
Assim como ocorreu em 1980, 2017 foi um ano de notícias negativas para ele tanto do ponto de vista pessoal quanto político. Em fevereiro, morreu sua mulher, Marisa Letícia, com quem estava casado desde 1974. Além dos três rebentos que tiveram, Lula assumiu o filho do casamento anterior de Marisa.
Cinco meses depois, foi condenado pelo hoje ex-juiz Sergio Moro a 9 anos e 6 meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex, pena posteriormente ampliada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Pedidos de habeas corpus para sustar a prisão foram negados no STJ e no STF.
Em 7 de abril de 2018, Lula se entregou à Polícia Federal, tornando-se o primeiro presidente do Brasil a ser preso após condenação penal. Ficou 580 dias na carceragem da PF em Curitiba, onde se aproximou de Janja, com quem viria a se casar. O período na prisão o impediu de disputar o pleito presidencial daquele ano. Fernando Haddad, o candidato que o substituiu, foi derrotado por Bolsonaro no segundo turno.
A libertação de Lula em novembro de 2019, um dia após o STF ter considerado a prisão em segunda instância inconstitucional, foi o primeiro passo para o retorno à vida pública. Naquele momento, Moro, símbolo máximo da Lava Jato, estava ao lado de Bolsonaro como ministro da Justiça.
Em março de 2021, Edson Fachin, do STF, determinou a anulação das condenações proferidas contra Lula pela 13ª Vara Federal da Justiça Federal de Curitiba –não apenas o caso do tríplex, também o do sítio de Atibaia (SP). Um mês depois, a corte confirmou a decisão de Fachin, devolvendo os direitos políticos ao petista e impondo uma derrota para a Lava Jato, cujo declínio se acentuou nos anos seguintes.
Em entrevista à Folha de S.Paulo e à edição brasileira do El País em abril de 2019, quando estava na prisão, Lula disse: “Penso que a esquerda pode construir um grande projeto para o Brasil e voltar ao poder”.
Fonte AGORA RN
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