O Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, que abre caminho para o governo do presidente Jair Bolsonaro implantar o programa Auxílio Brasil com um benefício de R$ 400 a partir de dezembro.
A proposta é estratégica para o Executivo por abrir margem para novos gastos em ano eleitoral. O texto foi alvo de críticas por adiar o pagamento de precatórios, que são dívidas reconhecidas pela Justiça, a partir do próximo ano, e por mudar a regra de cálculo do teto de gastos, a principal âncora fiscal do País. Após alterações, no entanto, o governo conseguiu os votos favoráveis no Senado, até mesmo na oposição, incluindo o PT. Foram duas votações. No primeiro turno, o placar foi de 64 a 13; no segundo, foram 61 votos a 10.
A PEC abre um espaço de R$ 106,1 bilhões para novas despesas no Orçamento de 2022. Senadores temem uma "farra eleitoral" no ano que vem, quando Bolsonaro tentará a reeleição. Por isso, o Senado alterou a redação para "carimbar" a destinação dos recursos ao Auxílio Brasil e despesas com saúde, Previdência e assistência social. De acordo com especialistas, a vinculação não garante esse limite, pois as despesas podem ser manejadas no Orçamento, mas os senadores críticos à PEC acreditam que haverá um compromisso maior com programas essenciais.
As mudanças promovidas pelo Senado criaram um impasse com a Câmara e levantaram dúvidas sobre a promulgação da medida. Como os senadores fizeram modificações no texto da PEC, a regra diz que a proposta deveria voltar para a análise dos deputados. O presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), afirmou que vai propor que o Congresso faça uma "promulgação parcial" da PEC dos Precatórios.
O regimento permite que o Congresso promulgue apenas os trechos que já foram aprovados sem mudança pela Câmara e pelo Senado. Os artigos que foram alterados, neste caso, seguiriam tramitando de forma paralela. A análise das modificações feitas pelos senadores na Câmara só deve ocorrer em 2022, segundo Lira.
A redação final da PEC no Senado manteve o trecho da proposta que muda o cálculo no teto de gastos a partir do próximo ano, mas mexeu no artigo que limita o pagamento de precatórios. Os dois dispositivos são essenciais para abrir o espaço fiscal de R$ 106,1 bilhões calculados pelo governo para 2022. Se o regimento do Congresso for cumprido, será promulgada somente a parte do texto que garante cerca de 60% da economia esperada pelo governo.
"Vamos tomar conhecimento com muita tranquilidade, muita calma, pelas duas Casas, para que possamos de maneira conjunta, Senado e Câmara, falar sobre a promulgação do que for necessário, urgente e adequado regimentalmente", disse Lira. "Não é porque a Câmara não concorda que vai valer aquele texto, muito menos porque o Senado fez que vai valer aquele texto. PEC tem que ser textos iguais".
Senadores independentes e de oposição que articularam as mudanças na PEC dos Precatórios com o governo já afirmaram, nesta quinta, que são contra esse "fatiamento" do texto. E cobraram do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e do líder do governo na Casa, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que busquem um "compromisso" da Câmara com a nova versão.
Mudanças
A versão aprovada pelo Senado limita o pagamento de precatórios da União até 2026, e não mais até 2036, como estabelecido anteriormente pela versão aprovada na Câmara. De acordo com o relator no Senado, a mudança ocorre "dando tempo suficiente para o Poder Executivo melhor acompanhar o processo de apuração e formação dos precatórios e seus riscos fiscais, mas sem criar um passivo de ainda mais difícil execução orçamentária."
Além disso, o parecer vincula o espaço fiscal aberto com o limite no pagamento dos precatórios - uma folga de R$ 43,8 bilhões no próximo ano - às despesas com o novo programa social e gastos relacionados à seguridade social. Esse dispositivo foi incluído justamente para blindar a alteração de ser revertida na Câmara ou de a PEC ser fatiada na promulgação.
A folga aberta pela mudança do cálculo do teto de gastos em 2022, calculada em R$ 62,2 bilhões, também ficou vinculada e será destinada somente às despesas com a aplicação de programas sociais - neste caso o Auxílio Brasil - e gastos com saúde, Previdência e assistência social. Com as vinculações, o governo conseguiu o apoio das maiores bancadas do Senado. Até o PT, maior partido de oposição ao governo Bolsonaro, orientou de forma favorável.
O Senado alterou a PEC para impor um caráter permanente ao Auxílio Brasil, mas dispensou a necessidade de apontar uma fonte de financiamento para a despesa com o novo benefício social, driblando a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Essa exigência só ocorrerá se houver um novo aumento no programa a partir de 2023. Consultores criticaram essa alteração.
Outra mudança feita pelos senadores foi retirar R$ 16 bilhões dos precatórios referentes ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (Fundef), cujos credores são na maioria os Estados, do teto de gastos. A medida, segundo Bezerra, abre espaço para o pagamento de precatórios alimentícios.
Segundo cálculo da Instituição Fiscal Independente, vinculada ao Senado, a PEC dos Precatórios pode gerar uma "bola de neve" de R$ 850 bilhões em precatórios não pagos até 2026. Para o diretor-executivo da IFI, Felipe Salto, a proposta representa, na prática, o fim do teto de gastos como foi concebido.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) vai entrar no Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar a PEC dos Precatórios se a proposta for promulgada pelo Congresso, afirmou o presidente da Comissão de Precatórios da OAB, Eduardo Gouvêa. "Continuam confiscando patrimônio privado para pagar o Bolsa Família. É isso que está sendo feito", disse Gouvêa. "O governo e o Congresso, ao invés de encontrar uma fonte de receita permanente para isso, pegou os recursos que são de terceiros, de pessoas físicas e empresas, e se apropriou desse recurso para pagar o benefício, ou seja, fazendo caridade com o chapéu alheio."
Já o presidente Jair Bolsonaro comemorou a aprovação do texto. “Ganha o Brasil”, disse ele, durante a solenidade de lançamento do Auxílio-Gás. Bolsonaro agradeceu aos parlamentares que votaram favoravelmente à proposta e voltou a dizer que a PEC não representa um calote no pagamento de precatórios.
Principais mudanças feitas no Senado
Prazo mais curto: O Senado diminuiu em 10 anos - de 2036 para 2026 - o prazo de duração do limite para o pagamento dos precatórios, dívidas que o governo precisa quitar depois de condenações judiciais;
Carimbo: O espaço fiscal aberto com a PEC será destinado para o Auxílio Brasil, despesas com saúde, Previdência e assistência social;
Educação: Os precatórios do antigo Fundef a Estados municípios ficarão fora do teto de gastos e não precisarão respeitar o limite da PEC, estabelecendo que 40% deve ser pago até 30 de abril de 2022 e outros 30% até 31 de agosto de cada ano, garantindo a maioria dos repasses antes das eleições;
Auxílio permanente: O programa de transferência de renda terá um caráter permanente. Os limites e condições serão dados por lei até 31 de dezembro de 2022. O programa não precisará apresentar fonte de financiamento exigida pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Fonte Agência Senado
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